terça-feira, 15 de novembro de 2011

Para ler

A ler, com urgência, o ENSAIO CONTRA A AUTOFLAGELAÇÃO, de Boaventura de Sousa Santos.

Cultura, Modernidade e Pós-Modernidade

1. A CULTURA Quando se fala em “cultura” não nos referimos ao proverbial “saber muito” ou “ser muito culto” mas à noção avançada por Sir Edward Tylor ligada à produção material e mental de cada grupo cultural, que dizia ser "todo o complexo que inclui saberes, crenças, arte, modos de vida, o direito, os costumes, assim como toda a disposição ou uso adquiridos pelo homem que vive em sociedade". A confusão entre saber e cultura foi inicialmente introduzida pelos pensadores iluministas do século XVIII, que asseguravam tratar-se do conjunto de conhecimentos específicos capazes de conduzir à evolução humana, e perseguida pelos românticos no século XIX, aferindo o modo básico de organização que assiste a qualquer grupo social. Mas foram mesmo os antropólogos evolucionistas, como Tylor, que construíram o conceito, aprofundado e depurado por Boas e seus sucessores, com o reconhecimento das especificidades relativas de cada comunidade, cobrindo o pluralismo de manifestações. Os estudos de Mead e Benedict, entre outros, comprovam esta percepção particular. Reúne algum consenso afirmar que a globalização cultural resulta de uma acelerada evolução pós-Revolução Industrial e perfila-se como exemplo da disseminação de referentes culturais muitas vezes apropriados por indivíduos que lhe atribuem validade subjectiva, como já atrás aduzimos. Como assinala Wernier (2000), não se trata simplesmente de “mundialização da cultura” mas da globalização de alguns mercados ditos culturais, enquanto estilete de mestiçagem cultural em curso mas recontextualizada, todavia, culturalmente ou, como aponta Featherstone (1995, 1999), da existência sentida de processos de integração e desintegração cultural que potenciam vivências culturais heterogéneas. É líquido julgar que estes mercados culturais se envolvem em trocas comerciais e monetárias, desenvolvendo políticas ligadas ao espírito do capitalismo, a saber, a maximização do lucro e a minimização dos custos numa óptica mundial, pois, como referia Wallerstein (1984, 1991), estamos perante um sistema aglutinador das partes concorrentes. Se fizermos um apanhado que resuma rapidamente este problema, podemos concluir que a globalização tem as suas origens na fragmentação da diversidade cultural, na introdução da moeda como elemento mediador das relações económicas e sociais, no desenvolvimento dos transportes e meios de comunicação e, finalmente, na industrialização, factores que favoreceram o avanço das indústrias culturais e sua implantação em quase todas as zonas do planeta colonizado, substituindo a produção de sujeitos para a comunidade pela produção de bens para a comunidade. Para compreender os seus avanços, é necessário perceber a forma como a globalização e os seus produtos foram absorvidos pelas comunidades e indivíduos. Nesta medida, devemos falar sempre no plural: existem “globalizações” e não e unicamente “globalização”, panoramas de diversidade cultural que irradiaram por imperativo da existência de fluxos de significados, como aponta Hannerz. (Hannerz, 1999). A sociologia e a antropologia desconheciam até há poucos anos este termo, globalização, como depositário de normas e valores. Contudo, implantou-se com toda a sua validade conceptual. Mas, uma vez que estamos a falar de globalização económica, é agora importante trazer à liça o contributo de Wallerstein (1984). 2. A GLOBALIZAÇÃO Este teórico situa o aparecimento de um sistema mundial, a que ele chama “moderno”, a partir da crise do feudalismo, ou seja, numa época muito próxima daquela a que já aqui fizemos menção, a idade moderna. Um sistema económico mundial emergiu, estabelecendo a partir de então a posição de cada uma das partes do mundo: centro, periferia, semi-periferia e as margens. Friedman (1994, 1999), para citar um dos vários exemplos de classificação a este nível, exclui a semi-periferia, mantendo, não obstante, os restantes termos classificatórios. Aquilo que Wallerstein apontava mantém substancialmente o seu teor na actualidade: assim, o centro detêm o controlo económico das trocas mundiais, com governos fortes e grandes exércitos, verifica-se uma mecanização total das tarefas agrícolas, o que garante desde sempre uma maior produtividade, elemento que serviu e serve ainda como factor de desenvolvimento da própria tecnologia; a periferia exporta matéria-prima para o centro para a produção de bens da economia capitalista; a semi-periferia caracteriza-se por procurar estabelecer e negociar a sua posição no mercado mundial, sendo, mesmo assim, explorada pelo centro; e, por fim, as zonas “externas”, “à margem” do sistema económico mundial. Segundo Wallerstein, o desenvolvimento e consolidação do sistema capitalista mundial passou por quatro fases. As duas primeiras situam-se entre 1450 e 1670 e caracterizam-se pela burocratização do poder do Rei, com o lançamento de impostos e taxas, pela homogeneização cultural dos territórios, pela expansão militar para protecção dos Estados e, finalmente, pela diversificação das actividades económicas, que cimentaram decisivamente o poder da burguesia que, aos poucos, foi investindo o que ganhava, produzindo riqueza a partir de um vasto mecanismo de exploração mundial que com o tempo, se ia consolidando. As duas fases seguintes situam-se entre o século XVIII e os nossos dias. O capitalismo industrial foi, gradualmente e para seu auto-sustento, conquistando novos mercados e procurando a expansão das suas trocas económicas, absorvendo zonas comerciais que consigo competiam e incluindo novas áreas, terminando a sua política expansionista com a implantação de indústrias nas zonas semi-periféricas. A exemplo de Wallerstein, também Robertson (1999: 34) indicia um caminho histórico percorrido rumo ao actual e elevado grau de “densidade e complexidade global”. Assim, a uma fase embrionária compreendida entre os séculos XV e XVIII, sucedeu uma fase incipiente desde o século XVIII até 1870. Desde 1870 até 1920 pontificou a fase da separação, que precedeu a fase da luta pela hegemonia, de 1920 até 1960, sucedendo-lhes a fase da incerteza, de 1960 até aos nossos dias e com um acentuar da crise em 1990. É de ressalvar que desde a primeira fase à última assistiu-se a uma complexificação da noção de indivíduo, assim como a sua fragmentação em identidades e afinidades múltiplas, potenciada pela progressiva luta e conquista de lugares globalizados no panorama mundial, sendo que as disputas tenderam para a afirmação do seu valor pessoal sem quaisquer restrições de fronteira. Ou seja, as identidades individuais foram obtendo maior detalhe, sendo curioso notar que se emanciparam a partir de um território que lhe serviu como estrutura de vanguarda. Em suma, a selectividade existiu enquanto escolha consciente do indivíduo cosmopolita. Se Wallerstein recua até ao século XVI e associa modernidade a capitalismo, Boaventura de Sousa Santos só aceita esta associação a partir do momento em que se instauram relações de produção “entre capital e trabalho e que determinam a emergência e generalização de um sistema de trocas caracterizadamente capitalista, que ocorre a partir de meados do século XIX quando o projecto sócio cultural da modernidade já está estavelmente constituído”. (Santos, 1997 (a): 72). Traçamos aqui uma das vertentes da globalização e vimos como esta pode ser ligada à modernidade e, de certa forma, à história expansionista do capitalismo. Contudo, os contornos sociológicos são diferentes dos históricos, uma vez que para a sociologia existem leituras diferentes sobre a modernidade e pós-modernidade. Segundo Featherstone, a primeira reporta-se ao abandono das estruturas tradicionais e sua substituição pela racionalização económica e administrativa do mundo, típica dos estados capitalistas, que Weber refere como "a organização racional capitalista (empresarial) do trabalho (formalmente) livre" (Weber, 1996: 16). A segunda representa a ultrapassagem desta fase e consequente transformação em era pós-industrial, em que o factor industrial produtivo gerador de riqueza é substituído pelas novas tecnologias de informação globalizadas. Ao mesmo tempo, sugere a "ruptura com a modernidade, envolvendo a emergência de uma nova totalidade social com princípios organizativos distintos" (Featherstone, 1991 (a): 3). Sendo assim, e sabendo que o modernismo é a cultura da modernidade weberiana e o pós-modernismo a cultura da pós-modernidade, as características essenciais do modernismo do início do século XX são “a autoconsciência estética e reflexividade; a rejeição da estrutura narrativa a favor da simultaneidade e montagem; a exploração da natureza paradoxal, ambígua e incerta da realidade; a rejeição da noção de uma personalidade integrada a favor de uma ênfase no sujeito desestruturado e desumanizado” (idem: 7) e do pós-modernismo nosso contemporâneo, “a eliminação da fronteira entre arte e quotidiano; o colapso da destruição hierárquica entre alta-cultura e cultura popular; a promiscuidade estilística facilitando o eclectismo e mistura de códigos; paródia, colagem, ironia, retórica e a celebração da aparente profundidade da cultura; o declínio da originalidade do artista; o pressuposto de que a arte só pode ser repetição” (idem). Identicamente, se as análises sociológicas modernas se debruçavam, entre outras coisas, sobre o impacto das tecnologias e da ciência nas sociedades tradicionais, as subsequentes análises pós-modernas incidiram nos efeitos que a produção de mercadorias de uma sociedade de consumo, aliado às novas tecnologias de informação, operou no seio das relações sociais. Torna-se fácil perceber e confirmar que a globalização não é apenas económica nem política mas, por arrastar consigo as indústrias da cultura, é também cultural, como apontam Rifkin, Robertson, Wernier, Baudrillard, Waters, Lash e Urry, Friedman, entre muitos outros que dividem opiniões. Se uns parecem ser unânimes em considerar a “globalização cultural” como um processo encabeçado por um centro produtor de imagens, ou “paisagens”, como defende Appadurai (1996), disseminadas para uma periferia encarregada de as reproduzir, outros, como Robertson (1991, 1999, 2000) ou Rifkin (2000, 2001), embora conjuguem a esfera cultural com a esfera económica, procuram entender a polifonia cultural. Esta perspectiva alternativa à compreensão política e económica da globalização é, então, a via cultural, que radica na perspectiva de recusar tratar a cultura como epifenómeno. Retomando um argumento anterior para acrescentar mais um elemento relativo aos factores que possibilitaram a globalização, Manuel Castells aponta o aparecimento de uma nova forma económica no último quartel do século XX, informacional e global: informacional, porque a produtividade dos agentes económicos depende da sua capacidade de reproduzir com eficiência informação, e global porque as actividades de produção, circulação e consumo se processam a uma escala global. Este novo tipo de sociedade só foi possível devido ao avanço tecnológico que o mundo capitalista atingiu, possibilitando que a informação se transforme em “produto do processo produtivo” (Castells, 1996: 67) ligando as diversas partes do globo munidas de semelhantes aplicações tecnológicas. 3. A PÓS MODERNIDADE Se assumirmos as palavras de Featherstone, esta disseminação de significados e a sua utilização prática está claramente ligada à “pós-modernidade”, que alguns autores formalizam em variadas expressões: transformação da cultura, do tempo e da experiência em mercadoria (Rifkin, 2001: 228); modernidade tardia (Giddens, 1994); desconstrução da expressão enquanto produção de contextos descontextualizados (Jameson, 1984); forma nova de nos relacionarmos com a modernidade, suas consequências, circunstâncias e desenvolvimentos (Smart, 1993); dissipação do valor e do significado do objecto (Friedman, 1994: 92); era dos simulacros (Baudrillard, 1991); passagem da experiência à informação (Waters, 1999: 148); “a esteticização dos objectos materiais, sua produção, circulação e consumo" (Lash e Urry, 1996: 4) ; apesar de lhe chamar sociedade “pós-industrial” ou “programada”, Touraine diz ser uma sociedade da “produção e da difusão maciça das representações, das informações e das linguagens” (Touraine, 1994: 424); outros vêem o “mundo moderno” como um sistema interactivo que descontextualiza e fornece uma leitura semelhante a uma espécie de “presente contínuo” imaginário, como é o caso de Appadurai, que deve ser vista como uma prática social (Appadurai, 1996: 31). Contudo não emprega o conceito de “pós modernidade”, substituindo-o por “excesso de modernidade” evitando uma postura tão integracionista como a de Wallerstein, pois o conceito de “paisagens culturais” sugerido implica uma fluidez que abrange todas as partes do mundo, sendo este não mais um sistema onde existe um “centro” e uma “periferia” mas uma comunidade de “mundos multi-cêntricos”, como lembra Pieterse. Latour (1993) é mais radical - como nós nunca fomos modernos, a “pós-modernidade” representa a impossibilidade da sociologia compreender a modernidade . Mas, relativamente à disseminação de significados, já Horkheimer e Adorno a apontavam em 1944. Estes autores iniciam um trabalho crítico das sociedades capitalistas, concebendo um conceito - “cultura industrial”, entendido como produção de objectos em série e de uma forma “estandardizada” com base na tecnologia - explicativo das sequências civilizacionais. Assume-se que a tecnologia tem um grau de legitimidade idêntico ao do capitalismo, formando par com ele neste panorama cultural em que os consumidores são meros reprodutores das estruturas de consumo, pressupondo a falta de liberdade individual mascarada pela ideologia liberal consumista, que classifica os bens a consumir. Os autores identificam aqui uma contradição entre a dimensão teórica burguesa-liberal e a dimensão da realidade burguesa - não há liberdade e vive-se num falso universalismo. O indivíduo é identificado com o geral, parte e produto do aparato sócio económico, e a sua utilidade resume-se a operar como mero consumidor. É básico dizer que a cultura é comunicação, mas Rifkin acrescenta algo mais a esta temática: colonizada pelo capitalismo, utiliza os meios de comunicação (fórmula já empregue por Boaventura de Sousa Santos quando faz notar a supremacia da lógica do mercado sobre a comunidade e que encontra par em Rifkin – “Ao longo do século XX, os valores das esferas política e cultural foram sendo cada vez mais absorvidos pela esfera económica” (Rifkin, 2001: 173)) para produzir a simulação de experiências deslocalizadas e encenadas um pouco por toda a parte, requerendo um consumo palpável de realidades estilizadas sempre que se pretende participar no acesso de bens culturais. Esta deslocalização e reprodução da experiência só é possível em condições de pós-modernidade, momento em que os laços comerciais se sobrepõem à cultura e se assiste à transformação dos mercados clássicos em redes de partilha. Desta feita, as relações económicas passam a estar organizadas em torno de uma lógica de acesso à rede de serviços e não mais de direitos de propriedade que, atravessando a sociedade de alto a baixo, a conduz a uma galopante mercantilização da experiência cultural traduzida como elemento de participação significativa. Considerando que a noção de “bem” foi substituída pela lógica do serviço, nada se esgota no acto consumista, visto como atributo principal da supremacia do acesso ao consumo sobre a propriedade: o primado das relações económicas com base em “conceitos e ficções” (Rifkin, idem: 75) transformaram as ideias em comércio que se desenvolve numa dimensão temporal, onde o que interessa é o “hoje e o agora”. Uma vez que as noções clássicas de propriedade se alteraram significativamente e com elas a estabilidade, regularidade e objectividade do conhecimento e da realidade cognoscível, a pós-modernidade assinala o aparecimento de uma crise epistemológica coincidente com a diversidade e contingência lidas na proclamação da indeterminação de Heisenberg. O crítico cultural Frederic Jameson identifica-a com a crise das ideologias, surgindo como refinamento de diversas manifestações culturais vistas como “alta-modernidade”. A arquitectura, segundo o mesmo autor, terá sido a sua grande precursora pelo facto de ter encetado uma crítica ao “ultramodernismo”, que entendia os edifícios como obras de arte. Com efeito, o debate sobre a pós-modernidade foi comum a inúmeras áreas do conhecimento, desde as ciências sociais à economia ou crítica literária, do cinema à fotografia. Surge no final da década de 70 e princípios de 80 do século XX, numa altura em que as políticas económicas neoliberais e conservadoras se voltavam a assumir com renovado vigor, época de crise e questionamento dos modelos da modernidade e sua validade. Vejamos um caso citado por Gerald Holton (1998), defensor nem sempre feliz da cultura científica contra os seus alegados inimigos, e que ilustra este desencanto. O relatório Bush, encomendado pelo presidente americano Roosevelt em 1944, é um exemplo da sedimentação das relações eufóricas entre ciência e sociedade, mas mais tarde, nos inícios dos anos 90, quando se revelam os números das vítimas provocadas pela ciência emergentes do resultado directo da sua intervenção na natureza, observou-se a sua desvalorização e relativização, embora a base de sustentação do relatório tenha sido a ideia da emancipação política dos países que a aplicavam frente às ditaduras fascistas em circunstâncias de guerra. Na esteira de Rifkin, Lyotard considera que este debate está associado à reacção às tecnologias de informação, computorização e mercantilização do conhecimento. Se por um lado representa a exaltação do progresso, da inovação e da novidade, proposta congruente com a circulação global de signos, por outro reflecte a mudança dos pressupostos analíticos marxistas, privilegiando o consumo em detrimento da produção e da sedução em relação à repressão e, ainda mais, a experiência individual diante de um todo que se considera palpável. Para além disto, a pós-modernidade teve a virtude de introduzir o diálogo e a discussão em torno dos temas metodológicos, epistemológicos e (a sua maior virtude) éticos. Mais desconfiado, Bauman, citado em Smart, defende que “a pós-modernidade é a modernidade habituando-se à ideia da sua própria impossibilidade”, ideia frisada por Lyotard, para quem o pós-moderno é meramente uma parte do moderno. Tal como Friedman, Jameson classifica a pós-modernidade, e não a modernidade, como “dominante cultural” das sociedades capitalistas, dizendo ser também a “era do decréscimo do afecto”, da “mercadorização da própria imagem” e, mais beckiano, a “era da ansiedade” (Jameson, 1984: 61). Como tal, afastou quatro teorias centrais ao conhecimento - primeiro, o jogo dialéctico entre “aparência” e “essência”; segundo, a oposição freudiana entre “latente” e “manifesto”; terceiro, as oposições entre “autêntico” e “falso”; quarto e último, a oposição semiótica entre “significado” e “significante”, destruindo os referentes e tornando os países capitalistas em “campos de heterogeneidades estilísticas e discursivas sem qualquer norma” (idem: 65). Ou seja, a pós-modernidade prolonga a imitação enquanto dinâmica cultural, comprimindo “espaço” e “tempo”, alusões identicamente aferidas nos textos de Braudillard e Featherstone. Neste sentido, há que reconhecer o valor da perspectiva de Waters quando alude a que a fenomenologia da globalização é reflexiva (Waters, 1999: 63) e a que a culturalização da vida social envolve trocas simbólicas situadas bem no âmago da sociedade de consumo - a cultura é vista como consumo auto-expressivo (idem: 120) -, associando-se, ainda, ao contributo de Braudillard, por exemplo, para concluir que a simulação de cenários hiper-reais ligados à encenação qualificadora da posição e estatuto social gira em volta da “homogeneização” e da “heterogeneização”, atravessadas por um estado de permanente tensão, assumindo desta forma a diferença entre “identidade individual”, que se considera pós-moderna, e “identidade cultural”, tida por moderna. A “hibridização cultural” produz identidades múltiplas, ou seja, a experiência cultural localizada não segue um caminho uniforme e estandardizado, e nem mesmo os referentes culturais globais se tornam congruentes com base nestes pressupostos. Friedman nota (1999) que a hibridização de práticas sociais corresponde a um conjunto de interacções entre o mercado mundial e a identidade cultural, entre o processo global e o processo local ou outras dimensões que se manifestam pelo consumo de objectos globalizados, sendo que o processo de cruzamento de categorias resulta em novas identidades, reiterando que globalização é hibridização, para além de heterogeneidade. Na sua contribuição para o mesmo livro, Anthony Smith (1999) contesta a ideia da existência de uma cultura global por o conceito de cultura se referir a algo estático, partilhado e homogéneo. Para aceitarmos o termo devemos agora modificar a escala, que passa a ser o planeta. A “cultura global” aparece numa altura em que a relevância política do Estado-Nação se dissolve gradualmente para ceder lugar à política de blocos, com opções e projectos económicos bem definidos. Contudo, baseia-se numa série de pressupostos estabelecidos de forma prévia. “Por baixo de um verniz modernista, encontramos na prática um “pastiche” de motivos e estilos culturais sustentado por um tratado universal científico e técnico” (Smith, 1999: 188). Smith verificou, em relação aos sentimentos de nacionalidade e de invenção de tradição em situação moderna, um recuo em direcção ao que se julga ser a essência, a tradição e o sentimento de pertença. Como a “cultura global” não tem “história” e, logo, memória, adapta-se individualmente. “Os bens de massa, padronizados e comercializados irão (...) recorrer, para o seu conteúdo, à revitalização dos motivos e estilos tradicionais, folclóricos ou nacionais no que se refere à moda, aos móveis, aparelhos e utensílios, à música e às artes, extraídos dos seus contextos originais e anestesiados” (idem: 189). Lash e Urry seguem a mesma linha de pensamento. Partindo de uma linha de análise marxista, consideram a pós-modernidade um produto da era pós-fordista, caracterizada pela produção e consumo de massa, surgindo o capital e as suas formas que circulam mundialmente como portador de significados. Assim, a pós-modernidade reconhece-se pela produção de signos e não mais de objectos materiais, signos esses que têm uma dupla função, cognitiva e estética, e se sobrepõem aos objectos materiais, os contornam e lhes atribuem significado. “A esteticização dos objectos materiais ocorre na produção, circulação ou consumo destes bens” (Lash e Urry, 1996: 4). A grande diferença de racionalidades que existe entre a pós-modernidade e a modernidade é que a primeira é estética e a segunda cognitiva e racional. “A reflexividade estética transmite auto-interpretação e a interpretação das práticas sociais de fundo. Se a reflexividade cognitiva pressupõe julgamento, a reflexividade estética, hermenêutica, está assente em pré-juízos” (idem: 5). Mas há que ressalvar um aspecto muito importante. Lash e Urry fazem uma crítica às teorias de Beck e de Giddens sob o horizonte dos parâmetros de reflexividade por estes estabelecidos. Tanto um como o outro empregam o conceito de reflexividade cognitiva numa perspectiva moderna, considerando o risco como conhecimento dos danos científicos e como monitorizado reflexivamente. Assim, encaixam as suas premissas nas de Lash e Urry ajuizando que a reflexividade deslocou os seus referentes das instituições políticas para as instituições culturais, plenas de força simbólica, e que a acção individual se situa no campo da produção individual a partir de “arranjos sócio-estruturais” (ibidem: 54) ou “lugares estruturais”. Aliás, em Giddens, Lash e Urry e Beck, é vulgar assistirmos a enormes discussões em torno das concepções de modernidade e de pós-modernidade. Muito a propósito, Giddens alerta-nos para a existência de múltiplos focos de autoridade em condições de modernidade, aliando-os à noção de risco. Como este envolve um “cálculo essencial do futuro incalculável”, a tarefa individual reflexiva consiste em confiar nas alternativas escolhidas em relação a outros sistemas de conhecimento prático. A figura conceptual alternativa encontrada aproxima as dimensões do risco consciente e a resolução reflexiva do problema – a confiança activa, “uma confiança que tem de ser energicamente tratada e mantida” (Giddens, 2000: 176). Como já vimos, também de reflexividade é feito o enquadramento teórico de Lash. A nova teoria da modernidade reflexiva de Lash substitui uma concepção de acção individual vinculada ao dualismo estrutura/agência por uma outra que valida a existência de um novo conjunto de condições estruturais de reflexividade, acção individual essa que trocou as estruturas sociais pelas estruturas de informação e comunicação e a dimensão cognitiva da reflexividade pela dimensão estética da mesma reflexividade. Ou seja, a reflexividade moderna é possibilitada pela retracção dos sistemas sociais e o avanço dos sistemas de informação. A reflexividade estrutural, uma das condições da reflexividade em si é explicada por Lash: “a agência, liberta dos constrangimentos da estrutura social, reflecte sobre as regras e os recursos dessa estrutura e (...) sobre as condições da existência da agência social” (Lash, 2000: 110), assim como a auto-reflexividade “em que a agência reflecte sobre si mesma” (idem: 110). Nos dois casos, assiste-se à libertação da agência em relação à estrutura, porém vincada por uma dimensão estética que instituiu um concomitante consumo especializado e tem a sua fonte de poder no complexo que cria com o conhecimento, associando a acção à informação divulgada globalmente por empresas transnacionais. A reflexividade estética é mimética e fundamenta o princípio do “individualismo expressivo na vida quotidiana”. Mais uma vez, a “confiança activa” de que Giddens fala é fundamentada pela resposta das instituições reflexivas da modernidade. “A confiança activa surge quando as instituições se tornam reflexivas e as proposições dos peritos se expõem à crítica e à contestação. Com uma tal actividade crítica por parte do público leigo, a confiança nos sistemas periciais torna-se activa e não passiva” (Lash, 2000: 191). Isto significará uma monitorização acrescentada da vida quotidiana. Mas, embora se mantenha residualmente um ruído de fundo, é decisivo que a experiência cultural se assuma como cerne destas discussões teóricas e principal fundamento da acção social individual. A percepção semiológica dos elementos culturais é a chave que estruturará a dinâmica da acção social. A contribuir para uma maior complexificação dos debates entre pós-modernidade e modernidade, Alain Touraine e Bruno Latour insistem na tese de que a modernidade ainda não se cumpriu, que é um projecto não concluído e desvirtuado em relação aos seus cânones originais. Se inicialmente surge associada à racionalização ou racionalidade e ligada ao papel decisivo de actividade científica, a modernidade, segundo Touraine, não se reduz somente a ela, já que um dos seus efeitos mais perniciosos foi a eliminação do indivíduo, sujeito à normatividade dos sistemas de conhecimento, entre os quais, e o que mais interessa para este texto, a ciência. Ou seja, “a história da modernidade será sempre o diálogo sem compromisso possível entre a racionalização e a subjectivação” (Touraine, 1994: 55). A subjectivação constitui o resultado da ligação entre a consciência de si e a liberdade e responsabilidade e, nos seus termos, o chamado eu-mesmo, que pode muito bem ser lido como self. Assim, a modernidade não se cumpriu porque a sua “ideia” esbarrou constantemente numa prática discursiva adversa e contrária aos fundamentos. Isto pode levar-nos a afirmar que, se a modernidade se revestiu de estruturas que exerceram pressão sobre o indivíduo, impondo-lhe um conjunto de práticas, a “pós-modernidade”, termo combatido por ambos devido ao facto de que ainda não fomos modernos, resolveu o impasse em que se encontrava o sujeito, aproximando-o de si mesmo? O “cidadão” da modernidade, representante de uma tradição “naturalizante” da razão, das relações sociais e da própria visão do mundo social, precursoras da concepção da união entre homem e sociedade, dá lugar ao indivíduo osmótico, aquele que se une a si mesmo, ao seu complemento outrora naturalizado e domesticado e por isso incompreendido pela razão, o corpo. Tal como Wallerstein ou Robertson, que traçaram percursos descritivos sinalizadores da passagem da normatividade à desregulação, partindo de uma perspectiva económica e desembocando na dimensão cultural, também Touraine aponta quatro processos de fragmentação e decomposição da modernidade que, para além de terem provocado uma separação entre a “ordem da mudança” e a “ordem do ser” e entre a “ordem pessoal” e a “ordem colectiva”, a fizeram estagnar enquanto processo, sendo substituída por acções modernizadoras pontuais: em primeiro lugar, a existência de um conflito entre o desejo e a lei na área da sexualidade; em segundo, a ideia de consumo ser dominada pela racionalidade instrumental que satisfaz exigências individuais tornadas artificialmente necessidades; em terceiro, a ideia de produção regrada da empresa transformou-se em capitalismo especulativo financeiro; quarto e último, as lutas sociais confundem-se com lutas nacionais, florescendo o conceito de identidade cultural. A modernidade estilhaçou, segundo os seus próprios termos, a “racionalidade”, assaltada pela substituta e desvirtuada “racionalidade instrumental” que significou a “procura do prazer” na área da sexualidade, de “estatuto social” na área do consumo, do “lucro fácil” na área do mercado e de “poder” na área da nação. Consideramos esta crítica bem fundamentada e precisa, mas peca pelo seu conservadorismo político na medida em que não abre qualquer via à compreensão do horizonte das práticas sociais resultantes. Não obstante, faz sentido que a anti-modernidade, conceito por ele apontado, seja a primeira via de regresso do indivíduo à natureza, evidente nas obras de Nietzsche, Freud e Marx, que põem a nu a incompatibilidade entre “desejo” e “razão” e apontam os caminhos da superação. Os dois primeiros teóricos são muito considerados por Touraine, o último um pouco menos. O ponto de destaque da sua crítica surge quando separa “modernidade” de “modernização”. Esta última corresponde à agência não moderna dos agentes sociais, pelo facto de não ter seguido o percurso de passagem à razão. Sexualidade, consumo, mercado e nação encontram-se, no seu dizer, num estado desprovido de racionalidade intrínseca. “O agente já não é razão ou tradição, como pensava Weber, ele é procura de si próprio e redução, groupie e espectador, habitante do ecossistema ou membro de um grupo” (idem: 174). Se a pós-modernidade resulta da redução da modernidade à técnica, segundo a perspectiva da Escola de Frankfurt, para Touraine ela representa, por um lado, a ruptura social de uma “racionalidade técnica”, que permitiu níveis de inclusão e outros de exclusão, falhando redondamente o seu projecto universalista e progressista e, por outro, “a dissociação entre as estratégias económicas e a construção de um tipo de sociedade” (ibidem: 221), onde se troca a “racionalidade” pelo “realismo”, acabando-se com o social. É, em suma, a negação das “luzes”, enquanto naturalismo anti-humanista, pois, e segundo as suas palavras, a sociedade actual não é individualista e a racionalidade científica sempre desconfiou do indivíduo. A própria razão encontra-se submetida a “processos de modernização” e não faz parte da modernidade, e o indivíduo transformou-se num recurso do sistema capitalista, suprimindo-se para se ver substituído por objectos. Note-se que, para Lash e Urry, a modernidade é racional e a pós-modernidade estética, para estabelecermos um diálogo continuado entre as diferentes perspectivas teóricas. Para Latour, o termo pós-modernismo é vago e refere-se ao cepticismo sociológico com que se encarou a modernidade, descrita pela operacionalidade de dois conjuntos de práticas diferentes - tradução e purificação. O primeiro termo, tradução, aponta para a existência de misturas entre novos tipos de seres híbridos de natureza e cultura, num trabalho de mediação. O segundo termo, purificação, cria duas zonas ontológicas diferentes, os “seres humanos” referentes à cultura e os “seres não humanos”, referentes à natureza e à tecnologia. Assim, a produção do facto científico é obtido por via de uma tradução das condições que presidem ao facto e a sua purificação em conhecimento científico. A modernidade produziu híbridos e o seu sucesso residiu em ter mobilizado a natureza para as relações sociais, sem que no entanto esta deixe de ser algo exterior a nós e que não controlamos. Tal como Touraine, também Latour assinala a faceta negativa da pós-modernidade e do seu papel no esquecimento do “ser”, enredada no aspecto avassalador da tecnologia que age directamente sobre o indivíduo e, por inerência, nas relações sociais. Aliás, não são estes autores os únicos a reconhecer a eminência da utilização de novas metodologias sociológicas para o entendimento dos novos problemas que continuamente se levantam e que a sociologia parece não ter capacidade de compreender. Voltaremos a este assunto mais tarde. Assim, devemos, a partir daqui, orientar a nossa linha de análise a partir de dois vectores: primeiro, o da cultura e segundo, o da globalização, associando pós-modernidade a uma espécie de “dominante cultural” das sociedades capitalistas actuais (Jameson, 1984: 56). Desta forma torna-se necessário redefinir o conceito de cultura, enquadrando-o sob uma visão sistémica global, como defendem Appadurai (1996), Hannerz (1989, 1999), Friedman (1994, 1999) ou Featherstone (1991, 1995) que, simultaneamente, promovem um novo enfoque de análise social que deve, antes de tudo, mostrar-se atento à mudança cultural. Friedman aceita as terminologias, mas propõe uma nova abordagem metodológica dos factos sociais - entendê-los como “híbridos”, substâncias de contacto, mantendo o seu carácter de “abstracção da realidade” (Friedman, 1994: 74) não esquecendo que a cultura se refere “às especificidades sociais dos sistemas (…) relacionados com a personalidade e a experiência e forma como estão relacionadas com a produção de representações do mundo e a constituição de estratégias práticas” (idem: 25). Ulf Hannerz (1989) reivindica, nas suas reflexões sobre o tema, ferramentas teóricas úteis para a análise desta gama de fenómenos, a macroantropologia, visualizando o diálogo entre micro e macro e procurando muni-la de uma perspectiva holista que retrate a interconexão de subjectividades em lugares diferentes. O sistema mundial é visto como um misto de homogeneidade, por força do aparente esbatimento das diferenças culturais que conduzem a uma espécie de “sincronismo cultural”, e de heterogeneidade, já que a expansão da cultura capitalista gera movimentos periféricos de construção de identidades sociais e culturais permitindo a reformulação e reinterpretação dos conceitos globais pela periferia, atribuindo-lhes por vezes novas significações simbólicas. Roberston, nesta linha de preocupações, propõe a compreensão da estruturação das macro-relações sociais, “a estruturação concreta do mundo como um todo” (Robertson, 1999: 28), aferindo as conclusões dos aspectos analíticos e empíricos da globalização, e Rifkin (2001) segue de igual forma esta via, ao dirigir a sua atenção à experiência individual em condições de pós-modernidade, trilho de algumas disciplinas do espectro das ciências sociais que optaram por valorizar a representação, a metamorfose e a procura da experiência num contexto relacional e a personalidade como convergência de várias conexões, símbolos deste tempo. Se a modernidade se caracterizou estruturalmente pelo individualismo, pela distinção entre público e privado e pela abstracção como forma cultural, envolvendo a utilização aleatória dos seus “códigos, textos e discursos” (Friedman, 1994: 230), a pós-modernidade refere-se à “dissipação do valor e do significado do objecto” (idem: 92), agora globalizado e apropriado de forma individualizada de acordo com um esquema particular de reprodução social - nos dias de hoje, como refere Friedman, nada é consistente porque a modernidade declinou, arrastando consigo os parâmetros reconhecidos pelo grupo. Ou seja, a pós-modernidade, encontrando-se em situação de oposição operativa face à tradição e modernidade, ao contrário destas últimas, encerra uma perspectiva de orientação para o futuro alicerçada na fusão entre “corpo” e “alma”, celebradas como compósito a cuidar por uma manutenção vigilante - o self. É claro que estas palavras de Friedman merecem um comentário. Se bem que a tradição eleja a cultura, abstracção inventada por ocidentais, que permite transformar a diferença em essência (ibidem: 206) dando-lhe um cunho de “complexo de ideias e objectos” (Wendy Griswold, 1994), a modernidade eleja a racionalidade tecnológica e a pós-modernidade promulgue os impulsos naturais e a ruptura das regras, segundo os seus termos, nem tudo se extingue nesta vertigem niilista. Mas, se considerarmos a tecnologia como um recurso cultural a activar igual a tantos outros, indo desaguar, em primeiro lugar, à mesma foz de Friedman, no que se refere à globalização cultural, quando este autor aponta que ela se refere “aos processos usualmente designados por culturais, ou seja, relativos à atribuição de significado no mundo inteiro” (ibidem: 199), isto é, aos significados partilhados e reconhecidos mundialmente e em segundo lugar, à de Boaventura de Sousa Santos, reconhecendo validade nas suas palavras a partir do momento em que sustenta que a cultura de um grupo social não é uma essência, é uma construção em curso com dinâmicas sempre observáveis, teremos inevitavelmente de associar aos impulsos naturais e quebra das regras pós-modernas a utilização prática da cultura como característica auxiliar da produção de uma imagem pessoal. Robertson é peremptório em relação a estas ideias. Para ele, “existe uma autonomia geral e uma «lógica» em relação ao processo de globalização que actua com relativa independência em relação aos processos estritamente sociais e a outros processos culturais mais convencionalmente estudados.” (Robertson, 1999: 36). Nesta frequência de pensamento, Wendy Griswold apela à análise destas áreas de contacto e Zygmunt Bauman confirma esta linha de percepção individualizada da cultura, tratando-a como um dado objectivo. Para além disso, a sua ubiquidade revela uma disseminação negligente pelo mundo (Bauman, 1999: xiv). A cultura é vista agora como auxiliar de uma forma expressiva do indivíduo, sendo necessário compreender as relações entre sociedade e cultura e a inerente construção social de significado. “Um objecto cultural pode ser definido como um significado partilhado e incorporado. Noutras palavras, é uma expressão socialmente significável, audível, visível, tangível ou articulada” (Griswold, 1994: 11). Esta posição credita a visão de que os objectos se tornam “culturais” quando são mediatizados pela sociedade, sendo os receptores os construtores activos de significado. O nosso texto terá como narrativa de fundo esta perspectiva, que analisaremos a seu tempo. Voltando aos debates sobre a pertinência do pós-modernismo na história das ciências sociais, consideramos a crítica de Marvin Harris interessante para o entendimento do debate entre o pós-modernismo e as ciências sociais. Segundo ele, o grande suporte para a corrente pós-modernista na antropologia foi um movimento, na arqueologia, chamado “pós-processualismo” que, por via de uma tendência desconstrucionista típica, concebia os objectos culturais e o passado como textos sistematicamente produzidos baseados em pressupostos sócio-políticos, o que fez com que os antropólogos pós-modernos começassem a duvidar à partida da objectividade do observador, do trabalho de campo e dos próprios pressupostos da etnografia - conhecer a cultura de um grupo social - mas revelando-se manhosos nas autocríticas: criticam o trabalho de campo “trabalhando” o próprio trabalho de campo, fazendo etnografias sobre ele. Um pouco uma tentativa de limpar a própria casa e esconder o lixo debaixo do tapete do vizinho, baralhar e deitar as cartas ao ar, por acreditarem ser os seus instrumentos de análise mais verdadeiros e veneráveis. Contudo, não se pode dizer que o pós-modernismo se constituiu como um edifício autónomo no seio da antropologia, mas sim como resultado de um desenvolvimento ou configuração disciplinar particular que partiu de uma corrente interpretativa nascida no seu interior. Enquanto corrente teórico-científica no seio das ciências sociais é inaugurada, segundo uns, pelas reflexões de Daniel Bell entre 1962 e 1973, e mais concretamente pelo conceito de “sociedade pós-industrial”, qualificada por uma vasta maioria como momento futuro em que a cultura se autonomiza do social e todos os males advêm da ciência e da tecnologia e, segundo outros, a partir da altura em que Clifford Geertz afirma que as interpretações antropológicas são ficções. Contudo, não devemos minimizar o facto de esta corrente representar um passo em frente face às reflexões hermenêuticas e fenomenológicas que, nas décadas de 50 e 60 do século XX, assumiram grande importância nas investigações antropológicas e sua capitalização teórica. Bell teve como pedra de toque a especulação sobre cenários prováveis no futuro, e esta potencial transformação é identificada principalmente a partir de alterações na esfera da produção, no momento em que se substituem as mercadorias pelos serviços como principal fonte de rendimento das economias, e quando a crescente importância da ciência e tecnologia se assume como dado importante na orientação das sociedades. Bell era americano, e foram os autores deste país que mais foram influenciados pelo legado pós-estruturalista de pensadores franceses, tais como Derrida ou Foucault. Uma das várias técnicas utilizadas pelos pós-estruturalistas foi a desconstrução, herança de Derrida e que marca os estudos americanos dos finais do século XX, que produzirão, na antropologia pós-moderna, uma crítica ao seu legado epistemológico e metodológico. Com efeito, James Clifford aponta que a crise de consciência da antropologia ocorre entre 1960 e 1970, no momento em que a disciplina se vê enredada no problema da escrita etnográfica, levantado pelo abandono da metodologia do trabalho de campo sistemático em circunstâncias de reconfiguração da autoridade política das colónias, cuja propriedade pertencia aos países de onde provinham os antropólogos. Como a escrita etnográfica inclui inevitavelmente um diálogo intercultural redutível a um texto representacional da experiência de contacto, trouxe para a berlinda da discussão a autoridade etnográfica e científica. O mais curioso é que, após esta devastação inicial, se tenta procurar percursores desta perspectiva em autores como Lafitau. Foi conseguida esta busca? Segundo Carlos Reynoso (1998), importante referência na sistematização e enquadramento desta problemática, a antropologia pós-moderna pode-se dividir em três ramos ou correntes. Um primeiro, a corrente "meta-etnográfica" ou "meta-antropológica", na qual se incluem Clifford, Marcus ou Strathern. Embora questione a autoridade etnográfica, é considerada a "antropologia da antropologia", uma vez que analisa os recursos metodológicos da disciplina e procura alternativas à escrita etnográfica. O segundo ramo é o da "etnografia experimental", e proporciona material etnográfico para a primeira. Preocupa-se com a redefinição das práticas da antropologia. Crapanzano é um exemplo desta corrente de antropologia dialógica. O terceiro e último ramo é mais niilista: proclama a crise da ciência em geral e da antropologia por arrasto, propondo uma epistemologia de raiz e de cariz irracionalista. Os temas comuns a todas estas correntes são a desconstrução, a crise da ciência e o fim da história. Devidamente depurados, alguns conceitos servem para pensar os limites da Antropologia. Falamos dos conceitos de heteroglossia, que está na base do questionamento da autoridade etnográfica em Clifford, avisando para a polifonia que assiste à construção do texto etnográfico, ou a dialógica, metodologia alternativa à "investigação silenciosa" que caracteriza as ciências exactas, criticada por Tyler, quando faz notar que o texto etnográfico é, em grande parte, mais uma representação do antropólogo do que uma desejável evocação contextualizada. Mais difícil de conceber é o projecto da interpretação recíproca, que chamamos de hermenêutica participativa. Segundo Tedlock (1998), este instrumento de estudo antropológico é inaugurado por Marcel Griaule e Ogotômmelli no livro "Dieu d'Eau", e é acolhido como exercício pós-moderno, novidade ansiosa de matizar o estudo com pinceladas dialógicas multivocais. Será a única forma de evitar a poluição do vernáculo que a tradução representa, uma vez que a língua ou conceitos nativos, para serem tornados inteligíveis, foram traduzidos para a língua do antropólogo. Mais radical que Tedlock, Tyler faz notar o falhanço da retórica visualista e representacional do discurso e texto etnográficos clássicos, cuja sucessão natural será assumida pela antropologia pós-moderna. O trabalho de campo revela módulos de desempenho discursivo desintegrados, assim como o processo narrativo dos indivíduos convertidos em texto, a serem integrados pela pena unificadora do antropólogo. Assim, a etnografia pós-moderna pretende “provocar uma integração estética com fins terapêuticos” (Tyler, 1998: 300), à maneira da poesia, e a dialógica providenciará um “contexto de criação cooperativa de narrações (...) que resultará num texto polifónico (...), um discurso sobre o discurso” (idem: 301). Embora consagre a utopia da subjectividade, nega a utopia do futuro. São estas algumas discussões que a produção da cultura de uma forma auto-expressiva levantou na teoria social e suas bases conceptuais e metodológicas. Podemos, para terminar, concluir que cultura é hibridização? Alguns mostram-se renitentes em qualificar o contacto cultural, tornando-se aversos à problematização de índole mais reflexiva de uma nova referência conceptual. Quando atrás defendíamos que a ancestral classificação tyloriana já não bastava para definir cultura, preparávamos a ideia de que hoje em dia ela é contacto e não isolamento e o indivíduo a matriz que a incorpora. Sob esta perspectiva, importa prestar-lhe redobrada atenção, assim como ao que envolve e habilita, recolhendo dados etnográficos suficientes para percepcionar a mudança na esfera cultural, nas práticas, experiências, classificações, significados ou orientações, como sugere Featherstone (1991, 1995). Bibliografia Consultada e aconselhada Adorno, Theodore e Horkheimer, Max (1993) The Dialectic of Enlightenment, New York, Continuum. Alexander, Jeffrey C. e Steve Seidman (eds) (1990) Culture and Society: Contemporary Debates, Cambridge, Cambridge University Press. Amado Mendes, J.M. (1997, 2ª edição) História Económica e Social dos Séculos XV a XX, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian. Appadurai, Arjun (1996) Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization, Miennessota, University of Minnessota Press. Arriscado Nunes, João - “Fronteiras, Hibridismo e Mediatização: os Novos Territórios da Cultura” in Revista Crítica de Ciências Sociais, nº45, Coimbra, Maio de 1996. 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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Livro aconselhado

Olá a todos. Aconselho este livro, de Vitorino Magalhães Godinho, a todos os aprendizes de Sociologia. Na altura da sua morte, o jornal PÚBLICO escreveu o seguinte:
Foi um dos pioneiros da História e das Ciências Sociais em Portugal, devendo-se-lhe em especial a renovação e actualização da investigação sobre os Descobrimentos e a expansão portuguesa integrada numa perspectiva global, trabalho que materializou em dois livros fundamentais, “A Economia dos Descobrimentos Henriquinos” (1962) e “Os Descobrimentos e a Economia Mundial” (editado em dois volumes, em 1963 e 1970). Vitorino Magalhães Godinho interessou-se igualmente pela História de Portugal moderna e contemporânea, em estudos que vieram também reformular perspectivas de análise, como nos trabalhos “A Estrutura da Antiga Sociedade Portuguesa” (1971) e “Mito e Mercadoria, Utopia e Prática de Navegar, Séculos XIII-XVIII” (1990). Na biografia que dedica a Vitorino Magalhães Godinho no sítio do Instituto Camões, o historiador seu discípulo Joaquim Romero Magalhães escreve: “Das suas lições de rigor erudito, de alargamento metodológico e da problematização das fontes como objecto cultural, de ensaio de quantificação e de cruzamento com as diferentes ciências sociais, de fundamentação teórica e de aplicação de uma visão histórica aos diferentes domínios do saber, de cidadania activa resultou uma notável renovação dos estudos de História em Portugal”. E cita, a propósito, uma afirmação do próprio Magalhães Godinho, que lembrava que “não é possível analisar os problemas da realidade portuguesa contemporânea sem os inserir na trama da evolução do nosso país, quer dizer, sem estudar as condições de formação do mundo em que vivemos, a génese da nossa cultura, da nossa sociedade, da estrutura político-económica de Portugal”. Formação em Lisboa Vitorino Magalhães Godinho nasceu em Lisboa em 9 de Junho de 1918, filho de um oficial do Exército e político republicano, Vitorino Henriques Godinho, figura que se mostraria determinante na sua formação política. Fez os estudos secundários nos liceus de Gil Vicente e de Pedro Nunes, em Lisboa, tendo sido também na Faculdade de Letras da capital que se licenciou em Ciências Histórico-Filosóficas (1940), com a tese “Razão e História”. Torna-se professor extraordinário nesta faculdade, até 1944 (dois anos antes, tinha casado com Maria Antonieta Ferreira). Ruma depois a Paris, onde se torna investigador no Centre National de la Recherche Scientifique. Na capital francesa, estuda e priva com os grandes nomes da École Pratique des Hautes Études, entre os quais Lucien Febvre, Fernand Braudel e Ernest Labrousse, tendo deles bebido as novas metodologias de análise histórica desenvolvidas em volta da revista “Annales”. “Quando chegou a França, ficaram muito admirados, porque ele tinha já um tal conhecimento, uma tal quantidade de informação, que aqueles sábios não lhe podiam ensinar grande coisa”, recorda Eduardo Lourenço sobre este período da vida de Godinho. O filósofo e ensaísta continua: “Contaram-me que o [Fernand] Braudel disse isso mesmo a alguém: ‘Não se lhe pode ensinar nada’. Tinha muito prestígio nos meios académicos franceses. É uma das grandes figuras da escola dos ‘Annales’, com o Braudel e o Febvre”.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Congresso de Sociologia

VII Congresso Português de Sociologia cujo tema será "Sociedade, Crise e Reconfigurações", terá lugar no Porto, de 20 a 23 de Junho de 2012. Não falte!

Corpo e Tecnologia: analisando alguns produtos culturais


Este texto presta-se a discutir um conjunto de narrativas que falam da intersecção entre corpo e tecnologia. Espero que gostem e aguardo respostas.


A "teoria do corpo" bebe as suas influências num leque muito vasto e posto à disposição em canais de comunicação específicos. Neste sentido, podemos aferir que a preocupação com uma determinada estética performativa do corpo funda a sua base nas premissas individualistas da modernidade, recorrendo, para a sua manipulação, a ramos da ciência que conseguiram atender às expectativas individuais, estabelecendo para tal um conjunto de conhecimentos manuseáveis em direcção a esse fim. Mais curioso de notar é que as metáforas que ilustram o contacto entre corpos e tecnologia são exploradas por via de linhas próximas da arte, exemplos de uma narração que incorporou as ofertas do discurso científico e se apresenta como representação explícita de uma série de fronteiras discursivas, estudadas, por exemplo, por Arriscado Nunes ou Donna Haraway, momentos do resultado de corpos socializados com base em esquemas de compreensão miscigenados que, na sua soma, são a representação desse contacto.
No filme “Matrix”, que durante o ano 2000 suscitou grande curiosidade e afluência às salas de espectáculo, o jovem Neo, protagonista, é acordado por um dos computadores que o rodeiam no seu pequeno quarto de hacker, e só após ter engolido o comprimido vermelho fornecido por Morpheus é que se liberta de um mundo em que a ligação uterina à máquina era a constante que permitia a irrealidade. A partir daí, Neo rebela-se com a finalidade de vencer e destruir a Máquina-Mãe que, para além de comandar a sua existência por via de um “self digital” gerido por um sofisticado software de simulação de uma vida cibernética virtual, lhe procura negar a elucidação e alerta sobre a virtualidade da realidade dos outros, mas já não a sua.
Em “Existenz”, de David Cronenberg, é mais alucinado o contacto entre o homem e a máquina. Ligado a ela para navegar num mundo onde a realidade virtual pode ser operada pelo indivíduo para alcançar um refúgio de um mundo em demasia real, produz-se uma confusão de identidades próximas da esquizofrenia. Convém, porém, esclarecer certos termos aqui utilizados e explicar a razão do uso destes materiais neste texto.
Estão sempre presentes nos filmes e nas obras consultadas, nas páginas visitadas no “Ciberespaço” da WWW e em revistas e diálogos entre especialistas e utilizadores os termos Cyborg, Realidade Virtual, Interfaces, Próteses, conceitos que adquiriram validade conceptual e vêm sendo objecto de recorrência discursiva muito comum. Estes termos têm a sua história.
Em 1984, William Gibson publica “Neuromancer”, percursor da estética cyberpunk, que condensa temas que vão desde a morte do industrialismo à ânsia de um futuro incerto, comuns a partir daí a vários autores, sejam eles escritores ou realizadores de cinema, alguns dos quais já aqui mencionados. O cyberpunk, enquanto escola de um tipo de escrita de ficção científica, ensaia simulações e transgressões de cariz de contestação social em época de suposta falência de ideologias e procura, acima de tudo, denunciar algumas obras de vanguarda modernista. Os indivíduos entendem-se como produtos auto-criados pela tecnologia, assumindo modelos comportamentais próximos de alguém fascinado pela ciência, que domina e goza a linguagem do computador para produzir simulacros da realidade, eles mesmos fruto de representações transgressivas fundadas em regras conhecidas e manipuladas. O cyberpunk produz ruído consciente, resultado híbrido da sua conexão com o ciberespaço assegurado pela tecnologia que produz o hiper-real em que se move. “Um cyberpunk (…) remete sempre para as viagens nas auto-estradas da comunicação, para a vulgar alteração cosmética e cirúrgica do corpo e para o equilíbrio entre os pólos corpo-mente, que são desafiados pelas drogas e pelas biotecnologias que focam precisamente a correcção e o aperfeiçoamento do corpo” (Elias, 1999, p. 32).
Esta estética foi prematuramente ensaiada, embora com as devidas margens e carácter muito incipiente, no livro de Huxley, "Admirável Mundo Novo", escrito na década de 50 do século passado. Na sua narrativa, são abolidas as relações familiares e glorificado o sexo erótico; os indivíduos são fabricados em grandes laboratórios de produção, como em “Matrix”, e o seu destino é determinado pela dosagem correcta de substâncias nocivas ou necessárias, sobrecarregados com doses de moralidade em cilindros de sons; a infelicidade combate-se com o soma, substância alucinogénea que transporta para bem longe da mágoa que é a realidade.
Em “Matrix”, o conhecimento do “tornado consciente cyborg” (em Existenz todos os que desejam jogar possuem uma “bio-port”, interface necessário para se ligar a máquina) era também ministrado por módulos recebidos pelo cérebro em aprendizagem via “download” directo do computador. Curioso o seu nascimento para a “realidade” (“o que é a realidade?”, pergunta Morpheus, o seu guru na preparação da perigosa viagem iniciática ao programa de simulação neurológico que gere a vida dos indivíduos, o próprio Matrix): envolvido no líquido amniótico, munido de interfaces ou “periféricos de entrada” directamente implantados nos sistemas nervoso central e periférico, instrumentos fundamentais para a gestão do seu “self digital”, é retirado por uma Máquina-Parteira que, ao dar à luz num útero de aço, dá a luz a Neo. Sendo o “Tal”, sobreviverá aos ataques dos avatares da máquina central por possuir a intrínseca qualidade de saber para além do saber, garantindo-lhe uma antecipação em relação à acção seguinte, tornado capaz de libertar a raça humana subjugada às máquinas que a transforma em pilhas. Em suma, possui qualidades supra-humanas por ter estabelecido uma relação directa entre a máquina que gere a realidade mais concreta de uma sociedade e entrado em ruptura com a mesma máquina omnisciente que comanda e observa o seu rebanho.
Encontramos, nesta série de exemplos tão díspares, o terreno de batalha de saberes e discursos que se aplicam e modificam a intencionalidade temporal agora tornada legitimamente secular pela produção da ciência e que servem, para além de câmara de eco da estética cyborg atrás explorada, também como exemplo do seu poder na constituição de estratégias de acção. Os produtos culturais encorporam linguagens de percepção do mundo, remetendo-as para práticas estilísticas com efeitos concretos na racionalidade dos comportamentos. O que se torna sublime é o carácter da ciência com toda a sua força operacional de cosmovisão, a tecnologia. Sublime, porque fascina a possibilidade de ultrapassar os limites do corpo e transgredir as suas fronteiras (veja-se o exemplo das batalhas virtuais em “Matrix”, corpo a corpo, mera simulação de jogos “Manga”) e sublimado por isto tudo, por reconhecer no simulacro uma ponte fácil de acelerar o corpo visto como fraco mas tornado potente.
A divulgação no mês de Junho de 2002 do sucesso das implantações do chamado "olho electrónico" numa série de pacientes vem atirar mais achas para a fogueira que alimenta a discussão das relações entre corpo humano e tecnologia, a comensalidade física da tecnologia com o corpo humano. Jerry, o invisual anónimo precursor desta prótese tecnológica desenvolvida durante 30 anos pelo Dobelle Institute é disso exemplo. O dispositivo utilizado inclui uma câmara de vídeo digital aplicada a uma das lentes dos óculos e ligada a um pequeno computador que o paciente transporta à cintura, conectado através de eléctrodos ao seu córtex visual. Para ser posto em prática, exige uma espécie de ficha introduzida no couro cabeludo, que comporta alguns riscos de infecção: no crânio de Jerry foi aberto um buraco de cinco milímetros de diâmetro e passou a receber informações idênticas às dos ecrãs televisivos. Os eléctrodos são aplicados na superfície porque o movimento de cerca de dois centímetros do lobo occipital com a penetração de eléctrodos poderia provocar hemorragias, explica o cirurgião no site www.artificialvison.com. Em Portugal, e pela mão do cirurgião João Lobo Antunes, o sistema foi melhorado e experimentado, com cerca de 100 eléctrodos e renovação de software em pacientes portugueses, no Hospital da CUF. Da primeira vez que foi implantado em 1978, o computador era muito maior e mais pesado. Hoje é mais leve e do tamanho de um dicionário.

A história de vida – método e história


Caros alunos, deixo aqui alguns subsídios para o tema da "História de Vida".

O método da "história de vida", iniciado na década de 20 do século passado por alguns sociólogos da Universidade de Chicago, representa um marco importante no percurso interpretativo das ciências sociais. Tendo como pressuposto principal que a "vida" pode ser estudada através de um texto narrativo produzido pelo indivíduo, que ganha sentido enquanto projecção reflexiva e auto-expressiva de si próprio, o método biográfico apresenta-se como uma forma de compreensão das narrativas individuais e momentos chave na vida dos indivíduos, tomando como objecto de estudo as experiências singulares e a “colecção de documentos biográficos que descrevam os momentos de viragem numa vida individual” (Denzin, 1989: 69). Segundo Denzin, “o postulado central do método biográfico (...) é que existe uma pessoa «real lá fora» que viveu uma vida que pode ser escrita” (idem: 22).

Os textos narrativos, na medida em que congelam a experiência, possibilitam a abordagem hermenêutica reivindicada pelas ciências sociais, com o fito de caracterizar a estrutura ou contexto social que molda o comportamento individual. A recolha do maior volume possível de informação sociológica e a avaliação da sua representatividade em relação a uma cultura, cabendo posteriormente ao investigador julgar a possível pertinência de generalização, ao escolher um conjunto de experiências para aprofundar esse conhecimento pela via da entrevista, define a aproximação hermenêutica, sendo primordial o ponto de vista do sujeito, ele próprio objecto de análise. Mas porquê tanta atenção conferida aos momentos de viragem? O que são e em que é que são tão significativos?

Os momentos-chave ou «epifanias» são utilizados como ponto de partida para o narrador, que desta forma lhes atribui selectivamente significados fenomenológicos, e para o investigador que os interpreta, procurando discernir nos motivos explicitamente referidos os factores que presidiram à escolha. As epifanias “são momentos interactivos e experiências que deixam marcas na vida pessoal. Nelas, a personalidade revela-se. São de igual modo momentos de crise; alteram as estruturas de significado fundamentais na vida dos indivíduos.” (Denzin, 1989: 70).

Deve-se a Dilthey (1833-1911) a atribuição de um carácter filosófico à hermenêutica moderna, já bem afastada dos processos exegéticos devotados aos textos bíblicos que Schleiermacher (1768-1834) começou por contestar. Enquanto "arte da interpretação", com termo derivado de Hermes, mensageiro grego dos deuses, a hermenêutica opera sobre a historicidade e a consciência, mais propriamente sobre as manifestações objectivas da vida e a forma como são percepcionadas, e procura superar o dogmatismo positivista, atribuindo valor decisivo à complexidade do discurso individual. Para além disso, o seu projecto separa metodologicamente as ciências da natureza das ciências do espírito, que não podem ser reduzidas ao método das primeiras, “explicativas”: as ciências do espírito são “compreensivas”. Neste sentido, a reprodução descritiva da experiência em situação de diálogo pode ser considerada, em simultâneo, com objectividade e objecto de análise.

Contrariando o relativismo e cepticismo dos filósofos do seu tempo, Dilthey prima pela conservação da historicidade da vida, apontando a hermenêutica como metodologia das humanidades, resumindo o seu dictum: não existe compreensão sem pré-compreensão. No seu encalço, Gadamer considera-a como uma “capacidade natural do indivíduo” (Gadamer, 1998: 293) e privilegia a análise da experiência mediante a relação que se estabelece com um narrador: “A verdadeira interactividade dos seres humanos resulta de cada qual ser uma espécie de círculo linguístico e de estes círculos se tocarem e amalgamarem constantemente. O que assim acontece é sempre a linguagem, com o seu vocabulário e gramática, como antes e agora, e nunca sem a inesgotabilidade interna do diálogo que ocorre entre cada emissor e seu interlocutor. Esta é a dimensão fundamental do hermenêutico” (idem: 224).

Segundo Peter Berger, que aflora o mesmo tema, a reinterpretação do passado é parcial e semiconsciente, ou seja, o indivíduo ajusta as partes desajustadas e incorpora as memórias sedimentadas na imagem que possui de si. Os actos com relevância particular são por isso escolhidos selectivamente, reinterpretados continuamente, e as más memórias esquecidas em benefício das boas. Berger define o processo de compreensão interpretativa da própria biografia como "alternação". "A percepção de si mesmo diante de uma sucessão infinita de espelhos, cada um dos quais transforma a imagem numa diferente conversão potencial, leva a uma sensação de vertigem, uma agorafobia metafísica diante dos intermináveis horizontes do possível «eu»" (Berger, 1983: 75).

Esta actividade possui em si aspectos legitimadores e emocionalmente compensatórios para a própria imagem que o indivíduo detém de si próprio. “A experiência de conversão a um sistema de significados capaz de impor ordem aos dados dispersos de uma biografia pessoal é tranquilizante e profundamente recompensadora” (idem: 74). Crapanzano completa esta perspectiva, realçando que a realidade da história pessoal é diferente da verdade da biografia, uma vez que a selectividade de actos significativos ou censurados que concorrem para a preocupação que o sujeito tem em dar significado ao seu mundo, narrando e ordenando-o, está sempre presente. A narração projecta um outro eu individual metaforizado a partir do próprio indivíduo, que transfere a imagem de si para algo externo e consistente, porque verbalizado. A história de vida é, neste sentido, uma evocação particular de alguém que toma consciência de si. “A história de vida é produto do desejo de identificação do próprio autor (...) não é simplesmente informativa; é evocativa também. A sua avaliação requer compreensão da relação entre o autor e o seu outro, o interlocutor inevitável a quem se dirige” (Crapanzano, 1985: 10). A evocação individual revela, então, uma compreensão própria e integral do mundo. Desta maneira, o uso da história de vida permite “restituir ao sujeito a sua individualidade complexa”, como considera Levi, (Levi, 1989: 1328) percebendo o indivíduo como lugar de partida e de chegada de dimensões diversificadas: o eu-fenomenológico, que se refere às ideias, imagens e pensamentos que a pessoa tem de si mediante a experiência de relacionamento interpessoal.

Enquanto “ciência da consciência”, a fenomenologia, formulada nos moldes husserlianos com a finalidade de combater o subjectivismo inconsequente e o irracionalismo que aflorou no final do século XIX e princípio do século XX, visa superar a dualidade indivíduo/sociedade, pondo a tónica na facticidade contingente do sujeito conhecedor e abrindo a via à subjectividade do conhecimento individual. Esta aproximação representa, antes de mais, uma crítica ao conhecimento positivista e ao próprio conhecimento em si, promovendo um necessário "regresso ao sujeito".

Edmund Husserl (1859-1938), muito influenciado pelo seu mestre Franz Brentano, que opta por uma análise dos campos da consciência através da psicologia, procura superá-lo nesta perspectiva, tentando, contudo, discernir as mais diversas formas de subjectividade. Desta maneira, impulsiona uma aproximação ontológica baseada em realidades objectivas, sem que regresse à metafísica kantiana onde o idealismo do sujeito puro é matriz. Pelo contrário, Husserl privilegia a consciência e a intenção que dá sentido à existência. Ou seja, procura avaliar de que forma o objecto é dado à consciência e como se significa o social, atribuindo validade selectiva aos actos que são de igual modo exploratórios "de", "no" e "para" o conhecimento. Este método de redução fenomenológica consiste em ligar a produção de conhecimento ao indivíduo que conhece, versão mais apurada do cogito cartesiano sem que, como diz, se deixe de pôr o mundo entre parênteses, defendendo que o mundo é auto-constituição. Desta forma, superam-se o idealismo e os possíveis riscos de psicologismo, alcançando um conhecimento "real" aferido "ao que existe".

Uma terceira aproximação, preconizada por Heidegger em “Ser e Tempo”, e que foi desenvolvida por Watson e Watson-Franke no campo das ciências sociais, associa fenomenologia e hermenêutica, indicando-lhes um método alternativo ao dividir o seu enfoque pelos seguintes pontos: por um lado, o estudo da personalidade ou compreensão do “Lebenswelt”, ou seja, a consciência individual, a percepção e entendimento de si e do mundo e, por outro, o estudo da relação indivíduo/cultura ou a compreensão do indivíduo e da sua experiência subjectiva enquanto elementos significativos que compõem um sistema mais vasto. Inseparável desta abordagem ontológica, que conhece em Ricoeur ou em Gadamer importantes contributos, é a ideia de que o conhecimento é inseparável das suas condições de produção, ou que o indivíduo não pode ser separado do mundo que o rodeia. Esta alternativa procura dar sentido à subjectividade e às opiniões interpretativas, uma vez que privilegia a consciência fenomenológica individual num mundo social, assim como orienta a pesquisa. “A aproximação fenomenológica, que se preocupa com o significado e verdade subjectiva (resolve) a tendência nas ciências sociais de reduzir pessoas a categorias e abstracções ao serviço de modelos construtivos e testáveis” (Watson e Watson-Franke, 1985: 27). Isto é, “através de uma aproximação fenomenológica-existencial ao texto podemos alcançar uma melhor compreensão da subjectividade única do indivíduo e das possibilidades da sua liberdade que não seriam possíveis com outras abordagens” (idem: 50).

O uso desta metodologia, com todas as suas reconhecidas insuficiências e limitações, permite que se altere a perspectiva do investigador que recolhia a sua amostra e discorria em seu redor, à boa maneira das monografias clássicas que contemplavam vários domínios para os quais se devia estar bem preparado, para a de uma maior participação no envolvimento do indivíduo na sedimentação reflexiva da experiência. Desta forma, pomos em pé de igualdade as duas instâncias, não deixando de ser prudentes nem abdicando da procura de uma objectividade que o é na medida em que reconhece as condições de produção de conhecimento.

Dois textos, construídos a partir de histórias de vida, podem servir de exemplos de posições polares. Referimo-nos a "Worker in the Cane" de Stanley Mintz (1974) e a "Nisa", de Marjorie Shostak (1981), respectivamente. O primeiro livro tem como principal figura Don Taso, assalariado rural nos campos de extracção de cana de açúcar de Puerto Rico e o segundo debruça-se sobre Nisa, uma mulher bosquímane das últimas tribos de caçadores-recolectores de África, os !Kung. Don Taso, sujeito principal do livro de Mintz, representa o estilo de vida das classes baixas que habitam os bairros suburbanos porto-riquenhos, pobres e violentos. Foi escolhido pelo autor pela sua extrema inteligência e racionalidade, revelando-se um excelente informante, ao apresentar a informação de forma clara, concisa e situada cronologicamente. Shostak envereda pelo mesmo caminho quando escolhe Nisa, afastando-se, porém, do pressuposto da representatividade: o caso que escolheu não deve ser generalizado.

A sua hipótese de trabalho centra-se na análise preferencial do discurso de uma mulher ou, eventualmente, no de outra identicamente contactada, sempre que a preocupação seja ilustrar descrições etnográficas, de forma a estabelecer um paralelo entre a cultura em estudo e a cultura do investigador, procurando, deste modo, identificar possíveis elementos ou processos comuns. Tal com Taso, Nisa foi escolhida como sujeito pela sua facilidade de comunicação e pela riqueza da sua experiência de vida. Todavia, o motivo que leva Shostak a optar por este caminho é de índole pessoal.

Numa época e contexto histórico em que a sexualidade e o casamento eram objecto de crítica, a autora confessa a necessidade de se compreender a si mesma no início de um período novo da sua vida, o casamento recente, avançando com a ideia de que, neste tipo de trabalho, o sexo do investigador assume uma posição fulcral, na medida em que permite penetrar com maior intimidade e segurança no "discurso das mulheres". Um homem veria barrados muitos caminhos e o seu trabalho tornar-se-ia, no mínimo, contraproducente. Este género de negociações tem paralelo, por exemplo, no trabalho de Marcel Griaule entre os Dogon das margens do Rio Níger. Só passados uns anos, depois da publicação de "Masques Dogon", e de terem concluído pela seriedade deste investigador, é que os anciãos decidiram dar a conhecer os aspectos mais esotéricos da sua religião, escolhendo para o efeito Ogotêmmeli.

A procura de um discurso situado não cria a ilusão da representatividade cultural, como nos recorda Shostak, da existência de histórias de vida universais: a história de cada mulher é diferente e vale por si só, as extrapolações são da responsabilidade da autora. Assim, Shostak procura elucidações e Mintz padrões, já que elege como hipótese a problematização das alterações sociais e históricas e a influência que exercem no percurso de um indivíduo, supostamente representativo dessa sociedade, tentando discernir, no caso de Don Taso, a relação existente entre a história passada do bairro e o seu presente, seguindo o percurso de existência de um homem. Numa proposta metodológica deste tipo, a informação chega-nos através de duas fontes: o individuo e o investigador, valendo-se mutuamente num processo de construção e contextualização dos dados empíricos, respectivamente.

Este género de rupturas discursivas deve-se a imperativos de cariz metodológico próprios, elucidativos da insuficiência dos dados fornecidos pelos indivíduos, por um lado, e dos constrangimentos pessoais e da necessidade de apresentação do seu discurso contextualizado para uma melhor leitura, pelo outro. Deste modo, o discurso dos indivíduos estudados alterna constantemente com o discurso do investigador. Por exemplo, Mintz apresenta quatro tipos: as cartas que Taso escreve e que resumem a sua vida, servindo posteriormente como mapas exploratórios de questões e de termo de comparação com a realidade social, o discurso do individuo estudado e da sua esposa, o próprio discurso de Mintz, quando intervém no discurso de Taso, por intermédio de parênteses rectos para contextualizar a informação, e, por fim, o discurso etnográfico. Shostak segue o mesmo caminho, adoptando um método similar na apresentação dos discursos, o etnográfico, o de Nisa e o seu, quando intervém no discurso do seu ego, por intermédio de notas que contextualizam a informação.

O objectivo dos investigadores incide num campo específico de questões nas quais mais se insiste e a que se concede maior importância. Shostak preocupa-se basicamente com a problemática da sexualidade feminina, tomando Nisa como um exemplo precioso da liberdade sexual das mulheres, na medida em que mantém livremente relações sexuais, mesmo quando casada, e por isso é punida; o leitor fica a conhecer os seus traços psicológicos e físicos por intermédio das longas dissertações em que Nisa fala da sua vida sexual e de tudo o que esta abarca - filhos, família e amantes - e pela caracterização proposta pela antropóloga. Mintz inclina-se para a recensão dos traços definidores da "cultura da pobreza", dirigindo as suas perguntas de modo a explorar temas que aborda pontualmente sem tentar circunscrever qualquer um deles especificamente, mas situando-se sempre dentro dos objectivos da investigação. Isto leva-o a pôr a tónica na conversão de Taso, pois torna-se-lhe difícil compreender que um indivíduo com um passado socialista se converta a uma Igreja Pentecostal. Este assunto, explorado em pormenor por Mintz, demonstra a influência que as novas formas de culto tiveram sobre as classes baixas urbanas, estimulando sentimentos de fraternidade social e de grupo, por usarem um tipo de linguagem simples e acessível, visando captar a atenção, por um lado e, por outro, revela que a aceitação das novas igrejas por parte dos jauqueños é motivada por um movimento consumista iniciado com a ocupação americana da ilha, que envolve os "consumidores" sem provar a congruência da crença. Segundo Mintz, o new way of life afectou decisivamente a vida de Taso.

A partir destes exemplos pode-se pensar que o método biográfico se apresenta como uma tarefa aparentemente fácil, talvez demasiado fácil. Encontrar um ego que se prontifique a contar a sua vida frente a um gravador e a partir da transcrição do seu discurso, ordenado numa estrutura cronológica, "escrever um texto", poderá parecer perda de tempo, ainda mais quando o investigador e o indivíduo estudado se tornam amigos: a cientificidade, à primeira vista, ressente-se dessa proximidade. Contudo, o resultado acaba por ser mais rico do que as aparências podem levar a crer, ou seja, o que se extrai de um texto autobiográfico é passível de ser analisado sob ópticas diferentes, de acordo com a inclinação subjectiva do leitor ou investigador. Mas, apesar de tudo, não poderá a excessiva proximidade e a concentração na experiência autobiográfica de uma pessoa aparentemente representativa de uma sociedade ou estilo de vida desembocar num lirismo trabalhado, num discurso estilizado que caminha para um fim quase sempre imbuído de uma nostalgia perversa, por se observar um esbatimento das fronteiras entre a isenção científica e o senso comum, neste caso, o "sentimento"? É certo que o processo de selecção de um individuo implica inclinações, subjectividades, implica "esperar alguma coisa", mas não significa necessariamente que a partir daqui o método autobiográfico se revele débil ou nos leve a pensar que já possuímos a resposta que queremos encontrar, e que tudo não passa de um processo maiêutico. Nestes dois casos, Shostak peca mais ao assumir a investigação como bandeira pessoal, numa procura de elucidações de cariz íntimo, muito embora não sejam criticáveis as suas opções metodológicas, como não o são as de Mintz, demonstrando uma objectividade exemplar sem abdicar de uma aproximação fenomenológica e hermenêutica com tradição nas ciências sociais.


Bibliografia Consultada e Recomendada

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